Organização esportiva com grande tradição no mercado automobilístico procura gestor para sua divisão de corridas. O(a) candidat(a) deverá ter experiência comprovada em posições de comando e gestão de pessoas, perfil proativo, acostumado a trabalhar sobre pressão e ser dotado de grande resiliência. Inglês e italiano fluente. Preferencialmente ter experiência em gestão esportiva e conhecimento técnico automobilístico. Salário + pacote atrativo de benefícios. Enviar currículo para rh@ferrari.com
Um anúncio deste tipo provavelmente está em redação a esta altura em algum escritório da Ferrari em Maranello. Depois do desempenho tremendamente ruim no GP da Áustria, a temperatura da frigideira para Mattia Binotto aumentou sensivelmente. E o peso aumentou quando Louis Camileri, o CEO da marca, declarou que confia em uma recuperação, com a chegada de peças novas e “no trabalho de Binotto”.
Quem acompanha futebol, já viu essa cena: o time vai mal, a torcida começa a pressionar e a diretoria diz que o “técnico está prestigiado”. Esta é a senha para que, no próximo tropeço, haja uma demissão. Se formos colocar neste contexto, podemos considerar sim que Binotto está “prestigiado”.
O desempenho do SF1000 em Barcelona e agora na Áustria é mais uma pedra no que se transformou a gestão Binotto, que acumulou uma série de transtornos no ano passado, passando por problemas de estratégia e o controverso acordo com a FIA acerca da Unidade de Potência.
Fui um daqueles que viu a chegada do técnico suíço com bons olhos. Afinal, era alguém que conhecia a Ferrari em suas entranhas e entendia da parte técnica. Sem contar que seu estilo aparentemente sereno trazia alguma tranquilidade para todos, depois da chegada de Marco Matiacci, o breve e o irascível Maurizio Arrivabene.
Aí voltamos à velha questão dos livros de gestão: um bom técnico consegue ser um bom gestor? Não existe uma resposta certa para isso. Mas nos deparamos em diversos casos em que estas escolhas deram certas e outras que foram um verdadeiro fracasso. Vendo de longe, sem acesso a todos os detalhes, dá a impressão que, embora parecesse acertada, a posição de Binotto hoje não é das melhores.
Em janeiro, escrevi um texto publicado pela Julianne Cerasoli, chamando ‘Binotto de bomba relógio’. E ali já colocava a pergunta nas entrelinhas: seria Mattia Binotto o cara certo para tocar esta Caixa de Pandora que é a Ferrari? A Ferrari se perdeu no lado técnico bem como na gestão de pilotos. Faz lembrar aquela equipe dos anos 80 até o início dos 90.
Uma outra questão se faz presente: se demitir Binotto, quem assumiria seu posto?
Não existem bons profissionais disponíveis no mercado. Os que tem, são tratados a pão-de-ló e a Ferrari teria que desembolsar bastante para isso. Sem contar que um novo comando teria um tempo para poder se aclimatar e um outro tempo para implantar novas metodologias e fazer uma reestruturação. Talvez não se tenha a paciência para tal.
Com o agravante que o time se vê agora atrelado a um projeto que nasceu ruim e sem tantas condições para conseguir melhorar (para se ter uma ideia: o novo simulador, no qual foram gastos cerca de US$ 10 milhões, que era para ter ficado pronto em abril só começará a funcionar no final deste mês). O foco era fazer uma melhoria em cima do conceito do SF90 e focar em 2021. Tanto que até Simone Resta, que havia ido para Alfa Romeo, foi trazido de volta. Mas com as mudanças trazidas pela pandemia, o SF1000 terá que ser usado em 2021.
Caso a Ferrari resolvesse repetir a história e demitir Binotto logo, provavelmente a tarefa de tocar a equipe ficaria nas mãos de Laurent Mekies, atual Diretor Esportivo e responsável pela área de Pista e Performance. O francês era tido como um dos sucessores de Charlie Whiting na FIA, mas saiu de lá em 2018 para assumir o posto na equipe italiana. Teria a pinta de ser um interino.
Um nome que volta e meia aparece nestes momentos é o de Stefano Domenicali, ex-chefe de equipe entre 2008 e 2014. O italiano fez boa parte de sua carreira lá dentro e tem ainda um grande respeito por seus pares, até porque foi em sua gestão que a Ferrari venceu seu último título de construtores, e não descartaria uma volta. Hoje, é CEO da Lamborghini e Presidente da Comissão de monopostos da FIA.
A vida na Ferrari nunca foi fácil. O barco de Binotto está em águas muito agitadas e o cheio de fritura aumenta cada vez mais. Resta saber se a bomba-relógio estourará em breve ou teremos um técnico especializado em desmontar este artefato.
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