Coluna Grand Prix: 25 de anos de Stock Car

Existem três chances em quatro de a Stock Car ter um novo campeão neste domingo. Ao final de um dos campeonatos mais equilibrados dos últimos anos, quatro pilotos lutam diretamente pelo título e só um deles figura na lista dos campeões que a categoria teve em seus 25 anos de existência. O azar dos outros três é que este piloto se chama Ingo Hoffmann e já ganhou 12 vezes o campeonato. Mesmo assim, matematicamente ele é o que tem menor chance, porque soma 123 pontos. Os que tentam o título inédito na carreira são Cacá Bueno (125 pontos), Guto Negrão (126) e David Muffato (138). A marca do equilíbrio que caracterizou a Stock este ano está nos grids com, às vezes, até 20 pilotos separados por um segundo.

Como é bom ver uma categoria evoluir tanto, depois de ter passado por sérias crises no decorrer desses 25 anos. Eu participei, ao lado de outros jornalistas, de um grupo de trabalho que ajudou a criar a categoria em 1979. Época em que o Brasil lamentava o fim da carreira de Emerson Fittipaldi na F-1, mas confiava no novato Nelson Piquet e contava com o aparecimento de novos ídolos. O talento brasileiro estava sendo descoberto pelo mundo do automobilismo, mas nossos campeonatos nacionais não atravessavam um bom momento depois da fase áurea da Fórmula Super-Vê. Surgiu, então, uma competição monomarca, criada pela General Motors, que parecia ser a solução, pelo menos para aqueles pilotos que preferiam os carros de turismo aos monopostos (fórmula).

No decorrer dos 25 anos desta história, muita coisa aconteceu. Surgiram pilotos novos, outros encontraram na categoria um ponto de apoio para continuar suas carreiras ao voltarem do exterior, e os tradicionais fundadores foram segurando a barra diante das crises. Seja como pilotos ou, mais tarde, como donos de equipes, eles não deixaram morrer aquilo que acreditavam poder ser, um dia, o modelo de uma categoria de carros de turismo. Pela minha experiência, aprendi que um país só alcança a maturidade no esporte a motor quando, além de formar gerações de pilotos com talento suficiente para chegar a uma F-1, Cart ou Indy, consegue, ao mesmo tempo, ter uma categoria de turismo forte. É assim na Alemanha, na Inglaterra, na Itália.

De propósito, evito a comparação com a Nascar americana, porque, embora sirva de modelo para a nossa Stock em termos de espetáculo, não gosto do automobilismo americano como modelo de competição. A gente sabe que eles vêem o esporte de uma forma muito diferente da nossa. Eles gostam daquele futebol de bola oval que se joga com as mãos, os pés e muita brutalidade, e o nosso futebol, por lá, virou coisa de mulher. O automobilismo deles também é diferente do resto do mundo e, como dizem os europeus com uma boa dose de razão, nem um bom carro de rua eles sabem fazer.

Se há algo em que eles são campeões do mundo é na criação do espetáculo. E a Nascar, categoria caipira que nasceu dos “pegas” disputados em pistas de terra por carros envenenados para andar mais que os da polícia quando transportavam whisky ilegalmente durante a época da Lei Seca nos anos 30, se tornou hoje um campeonato que movimenta perto de 4 bilhões de dólares anualmente. Dinheiro que vem da venda dos direitos de TV, dos autódromos lotados, dos patrocinadores e do merchandising porque não há um torcedor na arquibancada que não tenha comprado qualquer coisa que lembre o seu ídolo: camiseta, boné, lenço de pescoço, anel, miniatura, bandeira, chaveiro, tênis, macacão, quebra-cabeça. Há uma infinidade de objetos à venda nas barracas em volta do autódromo.

É aí que nós, brasileiros, queremos ver a Stock Car chegar. É este o futuro ambicionado por homens de marketing que patrocinam equipes na Stock. Claro que a gente nunca vai ter o dinheiro que o público americano gasta. O consumo que existe lá é a única coisa que faz aquele país dar certo. Mas, guardadas as proporções, nós já estamos vendo a Stock Car brasileira dar passos enormes. A TV Globo é a grande conquista. O restante, vem na seqüência. Hoje em dia, como principal categoria do automobilismo nacional, a categoria já movimenta 42 milhões de reais e provoca um impacto econômico de 65 milhões em cada uma das cidades sedes das 12 etapas de uma temporada, segundo dados da Nokia, principal patrocinadora do campeonato. Entre equipes e organização, mais de 500 pessoas têm trabalho fixo na Stock Car, além de outras 350 pessoas contratadas em cada etapa para trabalho temporário.

O público nos autódromos, que foi de 144 mil pessoas na temporada de 2001, chegou a 264 mil em 2002 e, certamente, terá um aumento significativo ao final de 2003. Nas transmissões da TV Globo cada corrida teve sempre mais de 10 milhões de telespectadores, e o retorno de mídia (números de 2002) soma 87 horas de televisão, 112 mil centímetros de jornais e revistas, e 4.287 textos na internet. A Stock Car virou coisa de gente grande.

Novidades em 2004

O campeonato deste ano ainda nem terminou e as novidades para 2004 já estão planejadas. Além de mostrar diversos ângulos de cada carro nas transmissões ao vivo, um grande diferencial será a telemetria on-line, mostrando na tela da sua TV informações como aceleração do carro, frenagem, força G de cada curva e temperatura de pneu no instante que em a imagem é gerada. Além da sensação de estar dentro do Stock V8 através da câmera “on board”, o telespectador vai receber diversas informações técnicas em tempo real, com tecnologia móvel celular avançada trabalhada pela Nokia, e software de gerenciamento de dados e grafismo desenvolvido pela TV Globo.

Fora o lado técnico da performance dos carros, o público poderá conferir, por exemplo, a posição do volante numa curva e até os batimentos cardíacos do piloto. Parte disso, aliás, estréia já na corrida deste domingo em Interlagos, com os sensores e câmeras “on board” instalados nos carros de Cacá Bueno e David Muffato. Para 2004, a telemetria estará presente em todas as etapas transmitidas ao vivo pela TV Globo, que serão seis, das dozes programadas.

Comentarista das corridas que são transmitidas pela Rede Globo de Televisão.

Escreve colunas para o jornal “O Estado de São Paulo” há 10 anos, que são publicadas todas as sextas-feiras.

Leme é colunista da F1Mania.net desde o dia 08/08/2003.