Coluna do Rafael Ligeiro: Revolução que começa pelo bico

Mal entrou nas pistas para testes e o Williams FW26 tornou-se um dos focos principais da temporada 2004 de Fórmula 1. Logicamente, o motivo não poderia ser outro. O carro, apresentado no último dia cinco, possuí grandes astes que dão apoio ao aerofólio dianteiro. Com estética diferente de seu antecessor, o modelo impressionou até Pat Symonds, principal responsável na área de engenharia da Renault. Em matéria veiculada no site Amigos da Velocidade, o engenheiro garantiu que tentará observar as eventuais vantagens do projeto. “Nós iremos observar o conceito da Williams no túnel de vento”, disse. Além disso também garantiu que “outras equipes tentarão também”.

Embora pareça mero exercício de futurologia, a segunda afirmação de Symonds está correta. Quantas vezes a Williams terá seu design exótico copiado, isso somente o tempo poderá responder. Mas inclusive pelo McLaren M4/19, percebemos que adotar novos desenhos no nariz dos monopostos está se tornando uma tendência. Aliás, grandes revoluções na categoria começaram pelo bico. O Benetton B194, carro com o qual Michael Schumacher alcançou o primeiro título, em 1994, é um exemplo.

Muitos talvez não tenham percebido, afinal esse foi um ano delicado para a categoria: uma série de acidentes no início da temporada, um dos quais resultou na morte de um dos mais sensacionais pilotos da história, federação aplicando suspensão de duas provas para o líder erroneamente e, de quebra, um título decidido de maneira vergonhosa. Mas a conquista do alemão gerou um novo conceito na F-1 e no ano seguinte praticamente todas equipes adotaram o “High Nose” do B194, inclusive a então toda-poderosa equipe de Sir Frank.

Outro carro com nariz popular foi a Ferrari 156, de 1961. Tão popular que o apelido “Shark Nose” (palavra inglesa que significa “Nariz de Tubarão) acabou atrelada ao seu nome. Numa época em que a tecnologia somente começava a dar suas caras, o projetista italiano Carlo Chiti criou um carro de nariz alto, com duas entradas de ar que serviam como dutos para refrigerar componentes internos do carro. O resultado não poderia ter sido melhor.

A equipe dominou toda a temporada e conquistou os títulos de pilotos (com Phil Hill) e de construtores, primeiros da equipe com motor traseiro. Em sete corridas – a Ferrari não disputou a última etapa, nos Estados Unidos, em sinal de luto pela morte de Wolfgang Von Trips na corrida anterior, em Monza –, o time de Maranello venceu cinco.

É interessante notar que na contramão do 156 e do B194, esteve a Jaguar em 2002. Todos os problemas do bólido estavam depositados na dianteira. O carro tinha péssimo desempenho nos circuitos travados, onde usava-se muito downforce, pois o monoposto saía de frente. A três provas do término da temporada, o problema foi solucionado – inclusive com a criação de novas suspensões dianteiras. E além de levar Irvine a bons resultados ainda naquele ano, as alterações foram implantadas no modelo R4, sexto colocado dentre os construtores no último ano. Tudo bem que a nova pontuação e o talento de Mark Webber ajudaram. Mas é inegável que houve uma sensível evolução nos carros verdes.

Logicamente, não é possível afirmar se a Williams terá o melhor carro da temporada. Assim como 2003, o próximo campeonato será marcado por equilíbrio na disputa entre as grandes equipes, além da Renault, uma equipe com potencial para vencer corridas e incomodar o trio-de-ferro. Mas tenham certeza que o FW26 será um carro bastante competitivo. A equipe responsável pelo projeto da Williams é experiente e Frank Williams é um sujeito nada adepto a mudanças radicais quando seu time está bem. O bico do carro mudou pois trata-se de um avanço tecnológico, observado à exaustão durante testes aerodinâmicos. Avanço nem que seja nos décimos de segundos, não questão de beleza plástica.

Saberemos quanto essa revolução armada pelo time britânico dará certo somente ao longo da temporada. Porém mais uma página no conceito aerodinâmico dos bólidos de Fórmula 1 já está começando.

Crime à geografia: 2003 terminou, mas um erro que cometi na coluna “Ferias, Montoya, Slicks e Minardi” não merece passar desapercebido. A capital da Argélia é Argel, não Trípoli como havia mencionado. Aliás, o circuito mais tradicional do país é Staouéli, que sediou esporádicas corridas nas décadas de 1920 e 1930.

Um verdadeiro crime à geografia, matéria que tão bem dominava na época escolar…

Confusão na Sauber: Assim como a Williams, a Sauber já apresentou o modelo com o qual disputará a temporada 2004. O modelo C23 foi exibido pela primeira vez à imprensa em cerimonia na cidade austríaca de Salzburg, na última segunda-feira (12). E pude notar uma pequena confusão à vista: as cores dos capacetes de Giancarlo Fisichella e Felipe Massa são praticamente iguais. O que certamente nos salvará durante as transmissões é um diferencial entre ambos: a listra no capacete de Massa é um pouco maior que a de Fisichella.

307 no WRC: A FIA homologou na última sexta-feira (9) o modelo 307 que a Peugeot utilizará no próxima temporada do Mundial de Rally, o WRC. O carro substituirá o 206, modelo campeão das temporadas 2000 e 2002 com o finlandês Marcus Gronhölm.

Mandando um alô: Para Marcelo Azmann. Além de elogios, esse amigo leitor enviou-me um e-mail onde fez comentários inteligentes sobre automobilismo, mostrando muito amor pelo esporte.