Coluna La Rascasse: Le professeur

Por Fábio Jacques

Piloto francês, tetracampeão mundial de Fórmula 1. Até então, o que mais se aproximara do argentino Juan Manuel Fangio em número de conquistas (depois ambos seriam superados por Michael Schumacher). Teve como companheiros pilotos como René Arnoux, Nikki Lauda, Keke Rosberg, Nigel Mansell e Ayrton Senna.

Chamado de “Professor” (Le professeur) pela inteligência clara e objetiva, sabia como poucos administrar os pontos durante a época dos descartes, mantendo, por exemplo, uma segura terceira posição ao invés de buscar sempre a vitória colocando o carro em risco.

Entre suas equipes, Mclaren (7 anos, em duas passagens), Renault (3 anos), Ferrari (2 anos) e Williams (1 ano). Nunca correu por equipes pequenas e, com raras exceções, sempre disputou o título.

Quando Ayrton Senna se tornou seu companheiro de equipe, na temporada de 1988, Alain Prost já começara a escrever seu nome na história, com dois títulos mundiais (1985 e 1986) e momentos inesquecíveis como o GP de Mônaco de 1984.

Curiosamente, o destacado coadjuvante (ou seria, protagonista?) desta corrida seria justamente o então estreante piloto brasileiro. O GP foi disputado na chuva, e a corrida era liderada por um soberano Alain Prost na poderosa Mclaren, e Senna, ultrapassando a tudo e a todos na modesta e branca Toleman até chegar ao segundo lugar. Uma volta antes de ultrapassar o francês, a prova foi interrompida, garantindo a vitória do piloto francês no carro inglês. Curiosamente, Prost perderia o seu primeiro título naquele ano por meio ponto, justamente por causa da interrupção do GP disputado no Principado.

Dois anos depois, o GP da França de 1986. Na véspera da corrida de Paul Ricard, o Brasil tinha sido eliminado nos pênaltis pelos franceses da Copa do México de futebol. A vitória de Senna, além de lavar a alma dos brasileiros, apresentava novamente um ao outro, numa rivalidade que só cresceria no decorrer dos anos 1980. Foi naquela vitória que Ayrton Senna iniciou uma das maiores tradições de sua carreira, que foi a comemoração com a bandeira brasileira na volta após a bandeirada.

A pomposa apresentação da dupla de pilotos da equipe de Ron Dennis para a temporada de 1988 não dava nem ideia do que aconteceria. Naquele momento se estabelecia a rivalidade do bicampeão francês Alain Prost com o brasileiro Ayrton Senna, que já demonstrara a que viera, mas ainda carecia de pelo menos um título mundial para se tornar um dos grandes.

Se a Fórmula 1 dos anos 1980 fosse um roteiro de cinema e o roteirista fosse brasileiro, ali começava a luta do bem contra o mal. O brasileiro, claro, seria o mocinho, o David que começava a enfrentar o poderoso Golias. O gigante, papel de Prost, certamente seria também o vilão, o Darth Vader, a mente maligna por trás das derrotas e frustrações do pobre herói brasileiro. Não é necessário lembrar que isso não seria fiel à realidade, mas tampouco seria se o roteirista fosse francês e os papéis fossem invertidos.

A temporada de 1988 foi a de maior supremacia de uma equipe em toda a história, com 15 vitórias em 16 GPs disputados. Ao final, vitória de Ayrton Senna num emocionante GP de Suzuka, no Japão.

No ano seguinte a dupla continuava na mesma equipe e a rivalidade só aumentava, com o relacionamento entre os dois se deteriorando cada vez mais. Jornalisticamente é péssimo ficar enchendo o texto de adjetivos, mas o final da temporada de 1989 teve, para dizer o mínimo, um dos, mais controversos finais dos mais de 60 anos de Fórmula 1 até hoje.

O acidente entre as duas McLaren na entrada da chicane final de Suzuka decidiu aquele campeonato a favor do francês. No momento do acidente, Prost levantou do carro e saiu. O brasileiro, no entanto, pediu ajuda aos comissários, teve seu carro empurrado por alguns metros e seguiu na prova. Trocou o bico, lutou, correu, venceu, mas não levou. Por ter sido empurrado, Senna foi desclassificado e Prost foi declarado tricampeão mundial.

Em 1990 a rivalidade entre os dois estava no auge. Depois do discutido final de temporada no ano anterior, Prost se mudara para a Ferrari, dando lugar para Gerhard Berger na McLaren. E, mais uma vez, Suzuka definiria a temporada. Senna era o pole, e Prost vinha em segundo. Por decisão da direção de prova, entretanto, o pole largaria na “parte suja” da reta, favorecendo o segundo colocado.

Prost, como esperado, tracionou melhor que o brasileiro. Senna, no entanto, simplesmente não deu espaço para o francês, e os dois foram reto na primeira curva. Fim de prova para ambos, e Ayrton Senna bicampeão mundial.

Alain Prost correria ainda em 1991 pela Ferrari em decadência, e o título seria disputado por Senna e Nigel Mansell, na Williams, com vitória do brasileiro após um erro do inglês na mesma curva de Suzuka onde Prost e Senna saíram da pista em 1990. O ano de 1992 seria sabático para o francês, afastado da Fórmula 1, para onde retornaria no ano seguinte (1993) para ser o segundo tetracampeão mundial da história com o auxílio da super-Williams com suspensão ativa.

O pódio no GP da Austrália daquele ano se tornaria emblemático como a última vitória de Senna, e a última vez que os dois chegariam ao pódio, juntos ou separados. Era o fim da histórica rivalidade.

Nos anos 1990 Prost ainda tentaria se tornar chefe de equipe ao comprar a Ligier e criar a Prost GP, promissora, mas sem grandes sucessos.

Em uma entrevista dada em 2010 para o jornalista inglês Malcolm Folley, Alain Prost afirmou ter “consciência” de estar condenado a viver sob a sombra do seu maior rival. Ainda que seus números sejam melhores que os dele em diversos aspectos (incluindo títulos mundiais) e sua carreira tenha sido mais longa (de 1980 até 1993), não adianta. A forma como seu maior adversário se foi, e as grandes disputas daquela que muitos consideram a maior rivalidade da história da Fórmula 1 o condenam a ser sempre “o adversário de Senna”.

A imagem de grande vilão que os brasileiros começou a desmoronar no enterro de Ayrton Senna. O próprio Prost afirmou a Folley que pensou muito antes de vir, mas achou que a consideração pelo, no final das contas, companheiro e colega de profissão que morrera de uma forma que ele mesmo, Prost, poderia ter morrido tantas vezes, superava qualquer animosidade que o povo brasileiro pudesse ter com ele.

Alain Prost destaca na entrevista que foi surpreendentemente muito bem recebido no Brasil, e a imagem dele ajudando a carregar o caixão do brasileiro encerrou também, de forma honrosa, com aquela rivalidade outrora quase mortal, mas que raras vezes saiu das pistas.