Talvez o grande herói para os brasileiros seja, ainda hoje, o maior piloto de todos os tempos, Ayrton Senna. Mas para mim, com toda a licença, confesso que ele divide este posto com outra pessoa. Estou falando de ninguém menos que meu pai, Matheus Schnaider, um grande homem cuja existência acredito que todos deveriam conhecer. Curiosamente, a história dos dois se cruza de uma forma inusitada. Me lembrei deste caso pois, recentemente, li uma reportagem sobre a preparação de Bruno Senna, sobrinho de nosso grande ídolo, e também piloto, para as 24 horas virtuais do Le Mans em junho deste ano.
Sim, até mesmo uma das provas automobilísticas mais importantes do mundo teve que se adaptar aos tempos de pandemia. E apesar do bom resultado para a sua equipe, a WEC, na competição, Bruno Senna passou por uma verdadeira odisseia durante a preparação para a corrida. Desde treinos no celular por falta de simuladores até a impressão de uma peça 3D que faltava em seu equipamento. É fascinante como ele resistiu à ideia de ficar de fora, mas não é surpresa alguma para mim. Afinal, eu bem sei que este tipo de determinação deve correr no sangue da família.
Meu pai já nos deixou há muitos anos, mas compartilhou comigo uma admiração eterna por Ayrton Senna e me contou a história de como os dois se conheceram. Eu guardo com um imenso carinho a foto deste encontro até hoje. Deve ter sido por volta de 1980, quando o jovem Senna, em início de carreira, devia ter lá seus 20 anos recém completados. Meu pai atuava como vice-presidente executivo do Banco do Estado do Rio de Janeiro (BANERJ), onde tinha muito prestígio à época. Quando assumiu o cargo, encontrou a instituição com o maior déficit de sua história. Ao fim do exercício, o banco obteve seu maior resultado financeiro.
Eis que um belo dia, a secretária de meu pai avisou que havia um jovem piloto entrando em contato e que não vai falar com ninguém menos que o vice-presidente do banco. Meu pai, intrigado e sempre receptivo, topou encontrá-lo pessoalmente e, em apenas uma reunião, o patrocínio foi fechado. A conexão foi instantânea. Naquela mesma hora, meu pai entendeu que, se aquele jovem prometia ser um campeão mundial, assim o seria. Eles ainda não sabiam, mas este foi o primeiro grande passo da carreira de Senna rumo à eternidade na memória dos brasileiros.
Mas em nenhum momento achem que foi sorte ou destino, foi sabedoria de um homem visionário como meu pai. Eu não meço palavras em dizer, apesar de clichê, o quanto ele era um homem à frente de seu tempo. De uma infância pobre no Brasil, história esta que se iniciou com meus avós fugindo dos horrores da perseguição contra os judeus na Europa, meu pai se tornou um grande executivo de sucesso. É graças a ele que uma tecnologia existe hoje na casa da maioria das pessoas: a geladeira frost free. Ele também passou por outras grandes empreitadas na indústria farmacêutica e até no projeto que deu origem ao microondas, até ser finalmente convidado para tomar o maior posto executivo no BANERJ.
Eu fico orgulhoso de saber que ele acreditou em Senna logo de cara. Meu interesse por corridas começou desde criança. Creio que ele dirigia aquele Lotus preto. E comecei a ficar fascinado. Meu pai que, entre outras coisas era engenheiro mecânico, me ensinava sobre como os veículos funcionavam e aquele entusiasmo das corridas era incrível. Meu primeiro ídolo, meu pai, infelizmente, perdeu a batalha para o câncer em agosto de 1993, pouco menos de um ano antes do trágico acidente que nos tiraria meu segundo ídolo, Senna. Mas fico feliz que tenhamos juntos acompanhado tantas vitórias, que me deixaram fascinado por este universo toda a minha vida.
E é por isso que ainda acompanho seu legado, tendo profunda admiração por seu sobrinho, Bruno Senna. É claro que eu não sou um executivo de um banco tão importante como meu pai à época. Mas sou CEO no Brasil da empresa que é líder mundial em soluções telemétricas. E espero que um dia a mesma conexão que meu pai teve com Ayrton Senna possa surgir entre o Bruno e mim. Afinal, acredito fortemente que nossa tecnologia pode ajudá-lo a conquistar o posto mais alto pódio, que é o lugar natural dos Senna, essa família que leva no sangue o talentoso e a perseverança.
Do meu ponto de vista, no final dos anos 80 e início da década de 90, quando o Brasil vivia um de seus momentos mais turbulentos, Ayrton Senna conseguiu levantar a moral da nação. Suas vitórias eram doses de otimismo e orgulho para todos os brasileiros. E especialmente agora, em que vivemos novos momentos obscuros, quem sabe seja a vez de mais um Senna fazer isso por todos nós.
* Daniel Schnaider é CEO da Pointer By PowerFleet Brasil, líder mundial em soluções de IoT para redução de custo, prevenção de acidentes e roubos em frotas.