Em dupla com PH Costa, Rodrigo França estreia como piloto na Gold Classic, preliminar da tradicional Mil Milhas, acelerando um VW Voyage a mais de 180 km/h no autódromo paulistano
Entre as milhares de homenagens que já foram prestadas a Ayrton Senna no mundo inteiro, neste último final de semana tive a honra de contribuir com uma pequena e humilde demonstração de gratidão a nosso ídolo da melhor maneira possível: acelerando em Interlagos numa competição oficial… e na chuva!
Quem acompanha meu trabalho aqui também no F1 Mania sabe que acelerar não é uma novidade para nós, jornalistas de automobilismo. Em 2007, tive a ideia de criar um time inteiro composto por jornalistas nas 500 Milhas de Kart, que reúne os principais nomes do nosso automobilismo no Kartódromo Granja Viana para uma prova de 12 horas, reunindo estrelas da F1, Indy, Stock Car, Truck, como Rubens Barrichello, Felipe Massa, Nelsinho Piquet, Felipe Giaffone, Tony Kanaan, Christian Fittipaldi etc.
O Giaffone foi um grande incentivador e topou na hora! O resultado final foi “o esperado”: com uma equipe no melhor estilo “Jamaica Abaixo de Zero”, terminamos em 49o lugar, depois de perder quase cinco horas nos boxes consertando o kart de algumas batidas.
Depois disso, no entanto, levei bem a sério o kartismo, onde já competi no Campeonato Brasileiro (terminei em sétimo na F4 Senior, uma das mais disputadas), no Paulista (vice-campeão da F4 Senior no ano passado, em dupla com o piloto Dudu Godinho) e até em eventos internacionais, como no Audi Challenge realizado tradicionalmente junto com as 24 Horas de Le Mans no Circuit Alain Prost, que fica dentro da lendária pista francesa.
Nas 500 Milhas de Kart, fomos campeões da categoria Light, um feito incrível pensando em como começamos em 2007. Além disso, faço parte da equipe Car Racing KTF, que foi bicampeã na geral nos dois anos em que estive no time (2019 e 20).
Mas no último final de semana o desafio foi diferente. A convite do também jornalista-piloto Luc Monteiro, aceitei a missão de dividir o Volkswagen Voyage do amigo Paulo Henrique Costa para ser um dos 64 carros do maior grid do Brasil: a Gold Classic, que fez a preliminar das Mil Milhas Chevrolet Absoluta, que seria o equivalente a nossa “Le Mans”.
Por mais que eu tenha experiências anteriores pilotando carros em Interlagos (com supermáquinas como o Porsche Cup e o McLaren Senna) pilotar um Voyage de Divisão 1 é totalmente diferente. É um carro rápido que passa dos 180 km/h na reta (era usado em campeonatos nacionais do nível da atual Stock), com tração dianteira e traseira “leve”, ou seja, na freada, é bem difícil achar o limite sem fazer o carro rodar.
Para piorar, só consegui dar 8 voltas nos treinos livres, por conta de muitas bandeiras vermelhas ao longo das sessões – afinal, são 64 carros no grid (a Stock tem 25, para efeitos de comparação). E eis que veio a chuva em Interlagos. E todo mundo brincou comigo porque, afinal de contas, nosso carro foi todo em homenagem a Ayrton Senna.
E confesso, fiquei emocionado ao alinhar o carro no grid (em 26o na geral!), bem em frente ao lugar da arquibancada onde eu, em 1990, vi pela primeira vez uma corrida de F1. Lembro do lugar exato porque, naquela época, o “grid falso” da F1 era montando bem ali e eu vi BEM de perto Ayrton Senna, Alain Prost, Nigel Mansell, Nelson Piquet… todos eles ali, esperando a placa de 1 minuto para sair para a volta de apresentação.
Em 23 de janeiro de 2021, foi a minha vez de estar lá naquele grid. Já não pensava mais em pódio: sabia que minha meta agora, como total estreante, era fugir das batidas, rodadas de pista e trazer o carro inteiro. Essa agora era a estratégia para, quem sabe, contando com abandonos e acidentes, terminar no pódio, já que o PH tinha os pontos de um segundo lugar da corrida 1 (disputada pela manhã, no seco).
Atingi boa parte dos objetivos: sim, dei uma rodada “de leve”, mas rapidamente trouxe o carro para pista e, embora tenha perdido algumas posições, nenhum dos 40 carros que vinham atrás bateu em mim e continuei acelerando!
Foi impossível não escapar em algumas freadas fortes, como no final da Reta dos Boxes, antes do S do Senna, e na Descida do Lago. Como são 64 carros e todos eles antigo, a quantidade de óleo na pista molhada ficou gigante – um desafio mesmo para pilotos experientes, imagine para o novato aqui! Nem andar de kart na chuva com pneu slick se compara a este “sabão”…Detalhe: desde a primeira volta o limpador de parabrisa não funcionava, imagine como era enxergar com o spray de 64 carros na pista!
Coloquei em prática o pensamento de terminar a prova, não atrapalhar ninguém e sair com o carro inteiro. Deu certo! No final, conseguimos somar pontos suficientes para ser o quinto colocando entre os 15 da divisão nacional – e sair com um troféu logo em minha estreia em Interlagos, e na chuva!
Fiquei contente demais com a experiência – obrigado Luc e PH Costa pelo convite e Blitz Automotive por preparar o carro de forma brilhante. . E a OMP pelo apoio em todo equipamento para competir (pois nos campeonatos oficiais é obrigatório o uso de macacão, sapatilha e luvas anti-chama, com a mesma tecnologia que salvou o Grosjean na F1) .
Fizemos de uma singela homenagem a Ayrton Senna um momento inesquecível. E com aquela sensação de dever cumprido – um orgulho e tanto para aquele menino que, na arquibancada em 25 de março de 1990, se encantava com um mundo que parecia existir apenas na televisão.